Por Rafael Eid
Um filme com histórias indianas que assisti há pouco delineia um retrato triste de como o sexo é geralmente tratado, não apenas nesse país.
Resumindo: um casal se forma por interesse das famílias. O homem transa com a esposa sempre da mesma forma mecânica e apenas por cinco segundos. Em seguida vira-se de lado e dorme. A mulher é obrigada a aceitar a situação, pois esse é o papel e lugar que se espera dela naquela e em tantas outras sociedades. Mas ela recebe de presente uma calcinha com um vibrador. Estando no meio da sala, o aparato é involuntariamente acionado. A mulher deu um verdadeiro show de prazer e de orgasmo para os presentes. Como era de se esperar, a cena é vivenciada como um absurdo pelos presentes e causa a separação do casal.
O nome do filme é: quatro historias de desejo
Essas cenas são bem simbólicas, a mulher como objeto sexual do homem quando ele quer, o prazer de baixíssima qualidade no sexo e só vivenciado pelo homem que o trata quase como funcional para reprodução e descarga de estress, a mulher infeliz sem poder reclamar, o que não pode aos olhos daquela sociedade. Quando finalmente ela tem um momento de grande prazer, o que era para ser uma dádiva é reprimido pela maioria das pessoas . Além do término do casamento, a mulher tende a ser mal vista pela sociedade. O que fica de mensagem é que o prazer é errado, o prazer é pecado.
A visão e a vivência do sexo, aqui ou na Índia, de forma geral, ainda são muito doentias, em quase todos os aspectos, e uma desconstrução é demandada e é urgente. Essa é obrigatória para a chegada de uma nova casa. Não adianta uma reforma, quando as bases estão rachadas pelo machismo, pelas religiões, pela sociedade, pela hipocrisia, pela família tradicional.
Então como Osho afirmou: “Feliz são aqueles que têm a segunda infância em vida”, pois esses podem usufruir de leveza e de novidades com a cabeça e o coração puros. E no sexo isso também é possível. Então o primeiro passo é sua desconstrução. Depois dessa, aprender algo novo. De novo.
O ideal seria aprender sexo com total naturalidade, mas isso já não é possível em nossas sociedades. Então podemos usar uma grande ferramenta que está à disposição, o tantra e o neo tantra. A partir desses, a pessoa pode voltar a sentir e a se conectar com o Outro; consigo mesmo e com o sagrado do ato sexual; voltar a ver e experienciar o sexo como algo leve, natural e sem pressa; marcado por uma energia mais feminina, muito mais feminina, ou seja, com calma, leveza, paciência, conexão, cuidado, atenção; fazendo a energia subir lentamente e aproveitando cada ato, cada toque, cada beijo ou cheiro como se fosse o último.
No comum, usa-se o sexo para procriar, liberar stress, contar vantagem, ter poder, ter troféu. No tantra o sexo é qualidade e não quantidade, é leveza e não brutalidade, é flor e não arma; serve para fundir almas, encontrar o sagrado, viver o infinito no finito.
No comum as pessoas estão com pressa, têm que gozar, têm que ser rápido se não o pai vai ver, a mãe vai punir, Deus vai castigar. Não há tempo para preliminares, a não ser o que costuma ocorrer nos filmes pornôs, onde o foco é o homem, é o falo, é o machismo. No tantra é o contrário, não há pressa, o orgasmo não é obrigatório e às vezes nem desejado, as práticas começam muito devagar. Antes de acontecer, há a preparação do local; pouca luz para o racional não atrapalhar o sentimental e o emocional; com cheiros, música de qualidade, olhar com calma, conectado, poucas palavras, presentes no ato. Ao contrário do usual, o toque do genital é o último passo. Antes, todo o corpo é ativado por toques, cheiros, beijos, lambidas e ao chegar lá a companheira ou companheiro já está tão pleno(a) que o prazer explode os limites sem gozar, ou no caso da mulher podendo gozar várias vezes e se a penetração for acolhida, essa é lenta, profunda, podendo parar com o pênis dentro e depois voltar ao movimento. Maravilhosa dança.
No comum a posição sexual é sempre com o homem dominando a mulher, o poder não pode sair da mão deste. No tantra o culto é a feminilidade, a posição é a dela por cima, a velocidade é ela quem comanda, é ela a ganhadora das maiores alegrias do ato, e o homem fica extremamente grato e feliz por ver sua deusa indo pro céu e voltando.
Claro que há uma troca de polaridades, assim com o símbolo do ying e o yang; o escuro se torna claro e o claro vira escuro, então a guiança do ato pode passar para a mão do homem, voltar à mulher. E a relação se estende nesta fluidez, mas sempre com a predominância da energia feminina, com o cuidado, leveza e entrega no ato.
E o ato termina sem terminar; o tantra está sempre no começo.
fonte: https://buscadoresdesi.com/2018/11/15/sexo-uma-desconstrucao/